sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Entrevista com Themilton Tavares sobre teatro no litoral carioca (Paraty, RJ)

Themilton Tavares

Entrevista: Themilton Tavares, artista, professor e animador cultural de Paraty


O Grupo Arteatro entrevistou Themilton Tavares na VIII Mostra Rio São Paulo de Teatro de Rua em Mangaratiba. Por Nanda Rovere – Themilton Tavares nasceu em Niteroi, fez teatro no Rio e São Paulo. Na época da ditadura, descontente com a realidade em que vivia e com a dificuldade em produzir cultura, foi passear em Paraty, se interessou pela cidade e está morando lá há mais de 35 anos. Assim como Ailton, é animador cultural do Estado do Rio de Janeiro e já foi dirigido pelo colega de profissão em vários espetáculos. Além de parceiros profissionais, são amigos.

Themilton Tavares no jantar beneficiente do Paraty C&VB 2010

Themilton realiza três atividades em Paraty: ministra aulas de História da Arte e Filosofia no Colégio Objetivo, é animador cultural do CEMBRA (colégio estadual) e apresenta um programa de rádio diário na Rádio Nova Onda FM, onde toca MPB e faz entrevistas. Nas horas vagas dirige teatro, atividade que lhe dá muito prazer, sobretudo porque “consigo me cercar de pessoas especiais”, afirma o artista e professor. No momento, está em processo de criação de uma montagem que contém um tema ecológico e que será apresentado na próxima Flip.

Mostra Rio – São Paulo – Como é o seu trabalho em teatro lá em Paraty?

Themilton Thavares – Eu comecei fazendo teatro de rua. Sou um dos organizadores do I Encontro de Teatro de Rua em Paraty, um evento memorável. Como tenho vários empregos, a minha atividade teatral está restrita à Semana Santa, na qual há oito anos apresento um espetáculo.

MRSP- Conte-nos como é o processo de criação deste espetáculo da Semana Santa?

TT – É um Auto da Paixão denominado “Um Homem Chamado Jesus”, que reúne entre 120 e 130 atores. Para esse espetáculo, que é muito complicado para se produzir, eu conto com a ajuda do Ailton Amaral, do Zequinha Miguel, de Angra, que foi um dos que fizeram parte do I Encontro de Teatro de Rua em Paraty. O restante do elenco são pessoas de Paraty. Eu reúno diversas faces da comunidade nesse trabalho, desde crianças de cinco anos de idade até moradores da terceira idade.

MRSP- Você tem patrocínio e/ou apoio para produzir a encenação?

TT – È um trabalho que além de juntar muitas pessoas, exige um cenário e figurino grandiosos. Para o cenário, por exemplo, preciso de oitenta caminhões de areia para criar um morro, no qual a história acontece. Não poderia fazer este espetáculo sem apoio. Tenho a ajuda da Prefeitura, que não é suficiente, mas é muito importante.

MRSP – E a iniciativa privada?

TT – Os empresários não contribuem em nada. Aliás, eu sempre trabalhei sem ajuda financeira. O primeiro apoio que consegui foi para este Auto, que foi “encomendado” por um Secretário de Turismo de Paraty. Foi ele quem custeou a estreia do espetáculo e desde então tenho conseguido renovar as coisas que vão estragando com o tempo.

MRSP – Na sua visão, qual o papel do teatro de rua?

TT – É transformar a realidade, possibilitar a reflexão e democratizar o acesso aos produtos culturais. Para isso, é preciso a participação da comunidade assistindo aos espetáculos, senão a sua existência perde o sentido. Infelizmente, o povo deixa o teatro em segundo plano porque está viciado na TV, que já traz a informação pronta e proporciona diversão fácil de ser digerida. O teatro também proporciona diversão, mas dá mais trabalho ao espectador porque as informações são apresentadas de maneira mais consistente.

Cartaz da Mostra Rio-São Paulo de Teatro de Rua - Mangaratiba 2010

MRSP – Qual o panorama que você pode fazer sobre o teatro de rua na região da Costa Verde?

TT – Angra tinha uma tradição muito boa de teatro de rua, mas está morrendo porque os jovens estão saindo para fazer faculdade, tomando outras posições na sociedade, e não estão mais se dedicando a esse tipo de trabalho. Além disso, os organizadores da Mostra que acontecia na cidade não estão conseguindo manter o evento. Em Paraty, por sua vez, a tendência é a solidificação da cultura feita para a elite. Não vejo mais teatro de rua na cidade. Quem fazia era eu e mais um grupo, mas faz tempo que não produzimos. A falta de interesse do poder publico é que causa essa paralisação; a gente cansa de ficar “dando murro em ponta de faca”.

MRSP – Em Paraty, qual era a receptividade para a Mostra Rio-SP de Teatro de Rua? Neste sentido, qual a sua percepção sobre a receptividade da população de Mangaratiba?

TT – Por mais que se divulgasse a Mostra, o número de pessoas que gostava de teatro era muito restrito. As pessoas não saiam com o objetivo de prestigiar a Mostra, elas passavam pelos locais em que ocorriam as apresentações e ficavam assistindo. Tanto em Paraty quanto em Mangaratiba, percebo que ainda há muito a se fazer para que o teatro passe a fazer parte do cotidiano das pessoas.

MRSP – A que você atribui essa situação?

TT – O poder público não vê a cultura como um elemento importante que dá voto. Em Paraty, em Mangaratiba ou em qualquer outro lugar, os governantes não conseguem enxergar que valorizar a arte pode ser uma boa plataforma política e pode melhorar a vida de uma comunidade. Não interessa ao poder que a população tenha uma opinião mais apurada das coisas que estão acontecendo ao redor, por isso não apoiam os artistas como deveriam. O teatro de rua não exige uma grande produção, hospedagens em hotéis caros, gastos com jantares e altos cachês; são espetáculos geralmente que não levam um público gastante para a cidade e por isso também não interessa aos governantes.

MRSP – O que você pode falar sobre a Mostra idealizada pelo Ailton, já que você apresentou peças em anos anteriores e também organizou evento desse porte em Paraty?

TT – Eu acho ótimo, principalmente porque a Mostra virou um evento internacional, recebendo artistas de países como Angola e México. Ela proporciona uma troca de informações interessante, e mesmo os espetáculos regionais, suscitam uma interação positiva. Mesmo que para o público essa troca não seja tão produtiva, para quem participa ela promove o contato entre pessoas que amam e realizam teatro de rua. O Ailton trouxe a Mostra para Mangaratiba e Paraty perdeu muito com isso, devido à experiência dele. Lá estão criando um Festival de Palco e Rua, mas quem está fazendo a curadoria não tem experiência. Convidaram o Amir Haddad para ministrar oficinas, artista que esteve inclusive em outras edições da Mostra Rio – São Paulo como homenageado, e só apareceu uma pessoa… Isso prova que tem algo errado…

MRSP – Qual a sua percepção sobre Mangaratiba?

TT – Devido à minha atividade de animador cultural, eu vim a Mangaratiba há algum tempo participar de uma reunião numa escola que ficava perto da praia. Como não era alta temporada achei a cidade muito vazia… Hoje, tive uma percepção diferente. É uma cidade interessante, com um potencial grande para sediar eventos culturais e tem pessoas interessadas em apoiar cultura e mais especificamente, a Mostra.

MRS – Gostaria de fazer alguma observação final?

TT – Espero que a Mostra seja um sucesso em Mangaratiba e que aconteçam muitas e muitas edições. A possibilidade de fazermos as refeições num mesmo lugar, por exemplo, é uma oportunidade ímpar para troca de informações, já que muitos grupos não têm tempo para prestigiar os espetáculos dos colegas.

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