terça-feira, 7 de dezembro de 2010
Grupo Galpão lança livro sobre o processo criativo da trupe (São Paulo, SP)
Livro sobre parcerias do Galpão evita cabotinismo
LUCAS NEVES / DE SÃO PAULO
Um grupo de atores que busca preencher suas lacunas pelas mãos de diretores convidados, mas não tem pudor em reassumir as rédeas quando os desejos internos ficam sublimados pelo ponto de vista do "estrangeiro".
É esse o coletivo que emerge do livro "Grupo Galpão: Uma História de Encontros", de Eduardo Moreira, único ator que participou de todos os processos criativos da companhia mineira, fundada em 1982.
O volume de quase 300 páginas faz um retrospecto sem cabotinismo ou autocomplacência do trabalho com encenadores como Fernando Linares (um dos cofundadores), Eid Ribeiro, Gabriel Villela e Paulo José, cada um merecendo um capítulo. Há também seções destinadas à relação do coletivo com os diferentes saberes da construção teatral (música, cenário, texto) e com o cinema.
Em paralelo, desenha-se uma evolução das linguagens testadas pela companhia --do clown ao realismo intimista, passando pelo teatro de bonecos, de máscaras e pelo expressionismo de "Álbum de Família".
Já no primeiro segmento, dedicado a Linares, Moreira credita a saída prematura do colega (na terceira peça do Galpão) em parte a "um problema que sempre tivemos: a tendência a negligenciar o trabalho interno de direção".
Mais à frente, ao relatar um dos encontros do elenco com o polonês Jerzy Grotowski, pai do "teatro pobre" (sem grandes cenários ou pirotecnias), lembra que este acusou a falta de um líder nos fragmentos a que assistiu:
"Isso colocava um dedo na ferida da estrutura do próprio Galpão, que era e continua sendo um coletivo em que muitas vezes sobram caciques para poucos índios".
HETEROGÊNEO
Na conversa com a reportagem, Moreira diz que hoje, o grupo já é mais maduro no que tange a respeitar funções internas, mas reconhece que a rotina é muito calcada em conflitos. "Paradoxalmente, o Galpão tem essa longevidade pelo fato de ser muito heterogêneo", pondera.
Até por conta dessa heterogeneidade, sempre está a buscar algo diferente no cortejo a diretores. A Eid, pede auxílio para um banho de brasilidade e um afastamento do tom festivo das incursões na commedia dell'arte.
Já Cacá Carvalho, diretor de "Partido", abre a trilha de um teatro mínimo, que "desconfia das emoções baratas". E Paulo José faz o elogio da precisão da fala.
No livro, Moreira não se furta a tratar do fardo deixado por "Romeu e Julieta" e "A Rua da Amargura", parcerias com Villela --e os dois trabalhos de maior repercussão.
"Foi uma explosão do nosso trabalho, mas queríamos e precisávamos romper com isso. Era um peso", diz à reportagem. "Buscamos uma complexidade de influências e linguagens, que acompanha um envelhecimento. Isso requer uma mudança do teatro que fazemos. No começo, era muito físico, jogado para fora com energia. Hoje, temos de buscar outra qualidade."
O que fica, apesar da passagem dos anos, é o compromisso com o público. O autor inclusive insere críticas ao que chama de teatro (principalmente experimental) "viciado em desprezo ao senso comum e à comunicação".
"É claro que a gente precisa se desafiar, mas sem deixar de fazer com que as pessoas se sintam pertencentes àquilo", completa, na entrevista, antes de anunciar que Felipe Hirsch, Aderbal Freire Filho, Enrique Diaz e Cibele Forjaz estão na mira dos mineiros para encontros vindouros.
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